Módulo 16

 

 REALIDADE PSÍQUICA



Bastante empregado na psicanálise desde os primórdios até a atualidade, o termo realidade psíquica foi introduzido por Freud. Ao abandonar sua teoria da sedução, pela qual tentava explicar as neuroses pelas reminiscências de traumas infantis realmente acontecidos, ele passou a considerar que as fantasias têm o mesmo valor patogênico que as reminiscências e, ao mesmo tempo, atribuiu ao inconsciente o primado do aparelho psíquico. Assim, ele afirma que “As fantasias possuem uma realidade psíquica oposta à realidade material (...); no mundo das neuroses é a realidade psíquica que desempenha o papel dominante”. Ao longo da história da psicanálise, a noção de realidade psíquica sofreu várias reinterpretações, especialmente por parte de M. Klein e de todos autores que se dedicaram ao estudo do desenvolvimento emocional primitivo e ao tratamento com psicóticos.

ZIMERMAN, David E. Vocabulário contemporâneo de psicanálise. Porto Alegre: Artmed, 2001. p. 354

 

"Realidade psíquica." Qual é o significado desta expressão? Especialmente nas fases iniciais de uma análise, não importa tanto se os relatos do paciente correspondem à verdade histórica de como os fatos narrados realmente aconteceram. Antes disso, o terapeuta deve priorizar a verdade que está impressa no psiquismo do paciente. Com outras palavras: o que realmente importa é que o paciente, no curso da análise, seja o mais honesto possível com aquilo que ele sente, aquilo que é a sua verdade! A experiência da prática clínica demonstra o sem-número de vezes em que o relato das figuras dos pais, ora descritos como demônios por parte de alguns pacientes, ora como santos e extremamente idealizados, por parte de outros à medida que a análise avança, essas imagens vão se transformando de forma bastante intensa e significativa.

ZIMERMAN, David E. Psicanálise em perguntas e respostas: verdades, mitos e tabus. Porto Alegre: Artmed, 2005. p. 135.

 

O conceito de realidade psíquica foi criado por Freud para designar o nível de realidade específica dos processos da psique. De um ponto de vista epistemológico, a realidade psíquica designa o objeto “construído” pela psicanálise, aquele que esta se propõe reconhecer e explorar.

O conceito de realidade psíquica está presente desde 1900 em A interpretação dos sonhos. Ele designa, à época, a força da realidade que pode assumir para um sujeito a atividade da vida fantasmática de seu mundo interno, força da realidade que se opõe e pode até mesmo “dominar” a realidade exterior, ou seja, impor-se como mais “real” do que esta última. De imediato, portanto, a ênfase recai sobre o “objetivo” da subjetividade, sobre a realidade da subjetividade para o psiquismo, e isso à custa eventual de sua relação com a realidade exterior, a qual pode ser ocasionalmente substituída por ela.

No contexto cultural da época, que tende a desvalorizar ou a depreciar o caráter de compulsão subjetiva que a atividade psíquica e, em particular, a atividade psíquica inconsciente pode assumir, trata-se de afirmar nitidamente o caráter objetivo para o Eu de certas formações psíquicas inconscientes, contra aqueles que desejariam reduzi-las a uma formação “imaginária”, logo, não real.

Em 1893, no seu artigo dedicado às paralisias histéricas, Freud já tinha apresentado o problema da “objetividade” do sintoma de conversão e do que ele exprime. A diferença entre a realidade biológica – da anatomia, em particular – e a realidade “psíquica” que os sintomas histéricos expressam começa a aparecer, prefigurando já a objetividade da inconsciência do Inconsciente: os pacientes não podem ser “simuladores”, conforme testemunha a objetividade das manifestações sintomáticas – anestesia, parestesia etc. A partir desse momento, a existência de um nível autônomo de realidade para o psiquismo e o psiquismo inconsciente, ainda que este seja o das fantasias, será afirmado de um modo cada vez mais nítido.

A segunda vertente do contexto em que surgiu a noção de realidade psíquica é o do traumatismo sexual e de seu valor etiológico. É em torno da oposição realidade histórica/fantasia que se trava então o debate. A neurótica elaborada por Freud num primeiro tempo confere a um evento traumático “real” – a sedução sexual de uma criança por um adulto – um valor causal determinante na etiologia da histeria e, de um modo geral, das neuroses. Entretanto, o processo dos tratamentos evidencia que à medida que as lembranças das cenas de seduções sexuais traumáticas são rememoradas retrocede-se no tempo a fim de chegar às cenas a propósito das quais é indecidível saber se eles efetivamente ocorreram ou se foram “inventadas”. A etiologia traumática é então relativizada em proveito de se evidenciar as fantasias infantis e a sexualidade infantil que elas exprimem. Essas fantasias, formas importantes da realidade psíquica, impõem-se ao psiquismo com a mesma “realidade”, ou até uma realidade maior do que os eventos reais.

MIJOLLA, Alain de. Dicionário internacional de psicanálise. Vol. 2. Verbete Realidade Psíquica p. 1560 e 1561.

 

Realidade psíquica: termo empregado em psicanálise para designar uma forma de existência do sujeito que se distingue da realidade material, na medida em que é dominada pelo império da fantasia e do desejo. Historicamente, a ideia nasceu do abandono da teoria da sedução por Sigmund Freud e da elaboração de uma concepção do aparelho psíquico baseada no primado do inconsciente.

Na história da clínica psicanalítica, a noção de realidade psíquica foi objeto de diversas reinterpretações (em especial por Melanie Klein e Jacques Lacan), as quais, na abordagem das psicoses e da relação de objeto, conduziram a acentuar a importância dela, em detrimento da realidade material.

ROUDINESCO, Elizabeth e PLON, Michel. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. Verbete Realidade Psíquica, p. 646 e 647.

 

Para Klein, embora a experiência possa enriquecer e tornar a fantasia mais elaborada, esta não depende da experiência para existir. Ao contrário, todas as experiências estão, de algum modo, predeterminadas pelo campo e pela dinâmica da fantasia, que ocorre desde sempre no nível inconsciente.

FIGUEIREDO, Luis Claudio e CINTRA, Elisa Maria de Ulhôa. Melanie Klein. São Paulo: Publifolha, 2013. p. 47.

 

  As fantasias inconscientes, sendo onipresentes, são uma categoria completamente diferente de eventos. A distinção nas opiniões sobre fantasia é radical, e sobre ela cada analista tem de decidir. Por um lado, temos a visão da psicanálise ortodoxa, de que existe quer realidade, quer fantasia; por outro, a opinião de que a fantasia inconsciente acompanha todas as experiências da realidade. Através de toda a obra de Klein, assim como na de seus colegas, fez-se a investigação da maneira pela qual a fantasia inconsciente interna penetra e dá significado aos "acontecimentos reais" do mundo externo, e, ao mesmo tempo, a maneira por que o mundo externo traz significado sob a forma de fantasias inconscientes.

HINSHELWOOD, R.D. Dicionário do pensamento kleiniano. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. p. 51.


CLIQUE EM CIMA PARA AMPLIAR


CLIQUE EM CIMA PARA AMPLIAR


CLIQUE EM CIMA PARA AMPLIAR


CLIQUE EM CIMA PARA AMPLIAR


CLIQUE EM CIMA PARA AMPLIAR


CLIQUE EM CIMA PARA AMPLIAR

Nenhum comentário:

Postar um comentário